sexta-feira, 24 de junho de 2011

Carta aberta ao Contador de Histórias

            Desde crianças recebemos uma educação voltada para um padrão comportamental que se vangloria da sobriedade e da normalidade. Muitas das vezes, esse padrão torna-se um obstáculo para a imaginação e o aprimoramento artístico. Somos tomados por uma timidez extraordinária, medo excessivo de ser alvo das críticas que nos obriga a uma vida convencional, desprovida de emoções e sentimentos.
            Uma das primeiras aprendizagens do contador de histórias é liberar-se das opiniões externas. Somente quando se respeita alguém mais do que qualquer pessoa no mundo é que se pode aceitar e incorporar suas opiniões ou críticas. Do contrário, ignorem-se as noções de terceiros sobre o que é certo para nós. Ninguém pode dizer-nos se somos jovens ou velhos, bonitos ou bem-sucedidos. Esses são conceitos que devemos criar para nós mesmos.
            Em meu primeiro contato com os futuros contadores de histórias sempre faço um pedido: que cada um explicite o seu objetivo e as suas metas. Somente com o conhecimento verdadeiro de nossas qualidades e defeitos e com trabalho constante poderemos nos libertar de atitudes defensivas ou preocupações alheias.
            O contador de histórias deve lembrar sempre que o seu alcance emocional deve ser estendido ao máximo. Não se pode ocultar alguma coisa e ser um narrador cênico. Tudo deve iniciar com o autoconhecimento. O contador tem basicamente o seu próprio corpo como instrumento.
Para ser contador de histórias faz-se necessário não acreditar em “dom”. O que os outros chamam dom eu prefiro chamar de predisposição, trabalho, vontade! Temos o direito de crescer como artista! O exercício da arte de contar histórias é processual, contínuo e exige do contador de histórias relativo tempo de amadurecimento. É preciso que ele conviva com suas histórias, contando-as e recontando-as para, na medida do possível, aprimorar as técnicas, construir uma linguagem própria e, especialmente, criar uma poética.
Outra faceta da contação de histórias reside na crença de que a cada vez que elas são contadas, também o narrador está contando-se, revelando-se e, nesse caso, não só é prazeroso contar, como é a possibilidade de dividir com o outro a história já vivenciada com toda aquela carga emocional, cultural, psicológica e/ou social de nossa existência, uma vez que, trata-se de necessidade vital, de algo tão antigo como a própria existência do homem e que faz parte da vida em comunhão: “conviver”.
 O escritor uruguaio Eduardo Galeano traz um belo conceito que confere ao artista da palavra um modo muito particular de pensar a contação de histórias: “Nas fogueiras de Paysandú, Mellado Iturria conta causos. Conta acontecidos. Os acontecidos aconteceram alguma vez, ou quase aconteceram, ou não aconteceram nunca, mas têm uma coisa de bom: acontecem a cada vez que são contados.
Que essa arte possa significar a busca de uma linguagem, de uma poética, de muitas técnicas, mas, principalmente, o desejo de traduzir instinto em arte e tornarmo-nos um contador de histórias completo.

                                                                                                   
                                               Saudações!

                                    Cleber Fabiano da Silva